domingo, 7 de novembro de 2010

"O Encontro", Opus 10, by Fábio Zafiro Filho


Luana estava pensativa: Iria só ou chamaria a Cibele para ir com ela? Aquele convite anônimo era tão inesperado e, ao mesmo tempo, muito excitante! Quem era aquele admirador, anônimo e secreto, que lhe mandava flores tão lindas e, no cartão, falava coisas tão doces e ainda a convidava para ir ao cinema?

Ela tinha recebido as flores em seu trabalho e as meninas tinham ficado com inveja. Nenhuma delas ganhava flores dos namorados, noivos ou maridos. E justo a única funcionária solteira da loja havia recebido flores tão lindas! Até a dona olhava para ela com ares de “O que essa garota tem que eu não tenho?”.

Quem seria o admirador?

Ela não tinha a menor idéia.

Alguém da loja?

Algum vizinho tímido?

Sim, ela já tinha recebido flores varias vezes em sua vida. Mas, geralmente sabia muito bem que as enviava, mesmo quando se tratava de um admirador secreto. Todos esses pretendentes eram previsíveis demais e ela não demorava mais do que algumas horas para saber quem era a pessoa.

Mas, dessa vez as coisas eram bem diferentes. Ela estava solteiríssima e querendo um período de paz e sossego, principalmente depois do relacionamento turbulento que manteve com o Caio. Não tinha ninguém em vista e não tinha notado nenhum admirador, secreto ou não, a sua volta.

Quando contou a história para a Carla, essa amiga disse que achava que era o próprio Caio querendo dar uma de romântico. Era possível. Mas, a chance de isso acontecer era remotíssima. Caio era um adolescente de 30 anos. Não tinha maturidade e nem sabia o que era romantismo.

O admirador tinha marcado o dia e horário que ambos se encontrariam para ir ao cinema. E se fosse um tarado? Um assaltante? Luana também pensava nessa possibilidade. Por isso tinha pensado em levar Cibele.

O interessante é que no convite o admirador falava de alguns detalhes que poucas pessoas sabem. Mencionava, por exemplo, as reais causas do rompimento com o Caio, os perfumes preferidos dela, a sua cor predileta, e outros fatos desconcertantes.

Que era alguém próximo era óbvio, mas quem?

Havia algo de pessoal, de próximo, de afetuoso naquele convite.

Isso a inquietava.

Quem era tão íntimo dela a esse ponto?

O encontro seria HOJE, e daqui a três horas. Precisava decidir se levaria ou não Cibele.

Dúvidas. Dúvidas. Por que as mulheres sempre estão tão cheias de dúvidas? Ligo ou não ligo?

Ligou.

- Alô, Ci?

- Oi, Lu, tudo bom?

- Você tem algo para fazer hoje?

- Não, por quê?

- Eu recebi um convite de um admirador secreto para ir com ele no cinema e estou com medo de ir sozinha.

- Você quer que eu vá para segurar vela? Nem pensar

- A gente vai até o cinema. Se estiver tudo bem, você inventa uma desculpa e vai embora.

- Piorou. Vou sair sozinha para levar você ao cinema?

- Ta, então leva mais alguém.

- Ta bom. Vou com a minha prima. Se o cara for legal, eu dou uma desculpa e vou com ela naquele barzinho perto da casa do Lelo.

- Brigadão, Ci.

- Vou cobrar com juros

- Pode cobrar sim.

Luana desliga o telefone e fica mais tranqüila sobre a situação.

Já poderia se vestir e se preparar para o grande evento.

Era estranho. Ela já teve alguns namorados. Mas, esse convite a deixava como uma menina que ia encontrar o primeiro namorado em frente da sorveteria.
Não sabia que roupa usar. Experimentou várias e nenhuma ficava legal.

Depois de muita hesitação, ela conseguiu tomar uma decisão.

Perfumada, maquiada e vestida para matar.

Estava se sentindo uma leoa!

Saiu.

Foi dirigindo até a casa da Cibele (que não tinha carro), passaram para pegar a prima dela, Vânia, no outro lado da cidade, e seguiram para o grande encontro.

Chegaram ao cinema no horário exato.

Ficaram na porta, que era o local marcado para eles se encontrarem.

As três ficaram observando os transeuntes, na tentativa de identificar o admirador.

Nenhum daqueles idiotas tinha cara de “admirador secreto”. No máximo, tinham pose de “play-boy do ano”.

Passou um rapaz desconhecido e as três viram o cara passar, dar um sorriso e ir dar um beijinho no rosto de uma adolescente ali perto. Ainda bem, porque era feio que doía.

O tempo passou e nada do admirador chegar

Todos já tinham entrado e as três procurando o “Don Juan”.

- Bom, temos duas opções: Ele não veio ou está lá dentro disfarçado – resume Cibele

- Vocês podem entrar comigo? – indaga Luana, preocupada.

- Claro, não perco isso por nada – respondeu Vânia.

- Vamos ver então o filme – responde Cibele.

Assistiram ao filme todo e nada de o admirador aparecer.

Saíram, procuraram, vasculharam tudo sem qualquer êxito.

- Deve ser um palhaço – diz Cibele, irritada.

- Talvez ele tenha tido um contratempo – diz Luana, sem graça.

- Dar um bolo desses, sem nem avisar – continua Cibele.

- Avisar como? Com outro bilhete e flores?

- Sei lá, ele que se virasse. Foi ele que inventou essa história toda, não você.

- Vamos ver se ele se justifica amanhã ou nos próximos dias

- Só você para defender esse cara, Luana!

Cibele estava revoltadíssima.

Luana caminhava calada, triste.

As três entraram no carro, deram uma volta, foram no barzinho e depois voltaram para casa.

No dia seguinte (um sábado), Cibele ligou para Luana:

- Lu, estive pensando sobre ontem.

- O que, Ci?

- Talvez o cara tenha se incomodado com a nossa presença lá

- Também pensei nisso

- Por que você não vai sozinha da próxima vez?

- Não to gostando desse encontro às escuras, Ci. To com receio!

- Receio do que?

- Você sabe. Hoje tem louco pra tudo. Não confio em caras que mandam convites assim.

- Tudo bem, da próxima vez você vai e eu fico observando vocês de longe. Se ficar tudo bem, você me dá um sinal e eu vou embora. Se você não estiver segura, você finge que me encontrou e ai eu fico junto com vocês, segurando vela.

- Ai, você faria isso por mim?

- Claro, né? Já segurei vela antes. Não se preocupe!

- Obrigada.

- Por nada, querida, agora vamos ver se ele se manifesta.

- Assim que eu souber de algo, te aviso.

No dia seguinte o “admirador secreto” manda para Luana não um, mas três arranjos de flores e uma caixinha de bombons muito finos – eram dinamarqueses. Ele se desculpava pela gafe e agora a convidava para irem, no dia seguinte, a um restaurante chique em um bairro nobre da cidade. Luana teria que espera-lo, novamente, na frente do cinema!

Todas as mulheres na Loja ficaram com a mais sincera inveja.

Luana ria, com gosto, das suas colegas de trabalho.

Ela estava feliz! A inveja de outras mulheres não poderia apagar o brilho da sua felicidade.

Uma das meninas lhe disse que nenhum namorado lhe dera bombons tão finos. Outra ficou chorando porque o seu marido nunca lhe dava flores.

E para piorar esse estado de espírito das funcionárias da loja, o admirador foi mais ousado ainda: enviou um perfume francês caríssimo, com um bilhete perfumado onde se lia uma inspirada poesia.

Isso fez com que Luana ficasse em êxtase e suas colegas furibundas.

A Cibele ficou feliz pelo bilhete e pelos presentes.

- Lu, esse cara é demais. Agora a coisa vai

No horário marcado, lá estava Luana. Vestiu-se como uma princesa: uma amiga emprestou um vestido muito luxuoso, estava usando jóias, passou o perfume que o admirador lhe enviara, se maquiou. Em suma: ela estava pronta para qualquer príncipe encantado chegar.

Cibele, como combinado, estava por perto.

Diversos homens passaram por ali. Uns estavam com a família. Outros sós. Havia alguns idosos com algumas crianças. Dos solitários, alguns pareciam gays e outros eram escrotos.

Nenhum deles parecia o príncipe dos bilhetes.

E, efetivamente, o príncipe não chegou!

Cibele estava transbordando raiva:

- Esse cara é um cretino, Lu

- Acho que ele quer me deixar doidinha

- Já está te deixando...você sempre defende ele.

Luana fecha a cara.

- Acho que nunca tive tantos presentes assim

- Talvez ele queira te seduzir com presentes para depois fazer uma entrada triunfal.

Ambas riram

- Acho que é bem por ai, Ci

- Tem homens ricos que não querem uma mulher, querem uma platéia para aplaudi-los só por eles serem ricos.

- Não acho que esse seja tão bobo assim

- Não temos como saber, Lu.

- Vamos esperar os próximos bilhetes...

Ambas se despediram.

Luana voltou para casa. Estava felicíssima.

Ficava pensando na inveja das meninas na loja, na preocupação da sua amiga Cibele e em quem seria o seu admirador secreto.

Depois de tomar um bom banho, ver TV e ler um livro, Luana sentou-se na cama e passou a escrever em uma folha colorida de papel de carta, com profunda emoção:

Querida Luana.

Não pude ir ao nosso encontro ontem. Espero que tenha adorado o perfume que te mandei, meu amor. O poema fui eu mesmo quem fiz. Vou ter que viajar amanhã para Paris. Daqui a dois meses voltarei para te encontrar e provavelmente te levar ao altar.

Espero que você goste dessa caixa com bombons franceses.

Beijos carinhosos e sinceros do seu grande admirador



Luana dobra o papel, coloca em um pequeno envelope. Ela irá levá-lo no dia seguinte à pequena loja que fica do outro lado da cidade, se apresentará como Dora, comprará os bombons e pedirá para que sejam entregues juntamente com o envelope para sua amiga Luana em seu local de trabalho.

Luana suspira e sorri.

Como tinha dito para Cibele, tem louco para tudo nesse mundo.

Luana era louca?

Se ela era louca, era certo é que era uma louca feliz.




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